Violência doméstica; decisão proferida em recurso | Ministério Público na Comarca de Bragança

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Violência doméstica; mãe deixa cinco filhos menores em casa entregues à sua sorte; decisão proferida em recurso (Ministério Público no Tribunal Judicial da Comarca de Bragança (Bragança, Juízo Central Criminal)

 

Por acórdão de 05.06.2024 o Tribunal da Relação de Guimarães concedeu total provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e em consequência revogou a decisão proferida a 10.1.2024 pelo Tribunal Judicial da Comarca de Bragança [Bragança, juízo central criminal] que havia absolvido a arguida da prática dos cinco crimes de violência doméstica de que se encontrava acusada, e em consequência, condenou-a pela prática dos mencionados cinco crimes, na pena única de 4  anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de 2 anos sujeita a regime de prova que passe pela sua participação em programa vocacionado para trabalhar as competências parentais.

Em causa a atuação da arguida mãe de cinco filhos: o mais velho nascido a 26.08.2008, outro a 24.11.2013, outro a 21.08.2015 e os dois mais novos a 01.05.2019.

O Tribunal de 1.º instância já tinha dado como provado que, no dia 16 de fevereiro de 2021, a arguida tinha-se deslocado a Lisboa, a fim de ver uma casa para poder alugar, comprar comida africana e fazer rastas no cabelo, tendo regressado a Bragança onde morava com os filhos no dia 21 de fevereiro de 2021.

Deu agora o Tribunal da Relação de Guimarães como provado, acolhendo integralmente a pretensão do Ministério Público que, nesse arco temporal, a arguida deixou os seus cinco filhos menores no interior da sua residência entregues à sua sorte, sem a supervisão e apoio de um adulto, não tendo adquirido, nem providenciado pela aquisição de bens alimentares para consumo pelos seus filhos enquanto se encontrava ausente. 

Ademais, a arguida não cuidou de prestar, ou solicitar a outrem que o fizesse, de forma habitual, os cuidados normais de higiene em relação aos seus filhos (designadamente a toma de banho, limpeza do corpo e lavagem da roupa) nem em relação à habitação, enquanto se encontrava em Lisboa. 

O Tribunal superior deu ainda como provado, tal como peticionado pelo Ministério Público que, a arguida sabia que os seus filhos menores não conseguiam nem poderiam cuidar deles próprios, designadamente os dois mais novos que, na data dos factos tinham 12 meses de idade, e não poderiam contar com o auxílio do irmão mais velho, que na data dos factos tinha 12 anos de idade, (e que a arguida havia encarregue de providenciar pela supervisão dos irmãos, nomeadamente, alimentá-los, mudar-lhes as fraldas e levá-los à escola, o que o menor fez dentro das suas capacidades), mas cujas tarefas atenta a sua idade, não lhe pertenciam, nem eram adequadas à sua idade e, não obstante agiu a arguida conforme o supra relatado.

Recorde-se ainda que, tal como já havia sido dado como provado pelo tribunal de 1.º instância, no dia 20 de fevereiro de 2021, a habitação onde os menores viviam, encontrava-se com lixo espalhado pelo chão, louça suja, restos de comida espalhados, emanando da cozinha da habitação um cheiro a putrefação. 

Também tinha sido dado como provado que os móveis existentes, alguns, encontravam-se espalhados pela casa, tombados no chão. Os menores dormiram num quarto onde se encontrava no chão um colchão sujo, sem lençóis e cobertores. Nesse quarto existia, junto ao colchão, uma tesoura aberta e fraldas usadas, cheias de urina, espalhadas pelo quarto. No interior da referida residência não existiam brinquedos nem telefone. A casa não tinha aquecimento e as crianças andavam descalças e sem meias, trajavam roupa fina e desadequada à época do ano, (recorde-se que os factos ocorreram em Bragança e no Inverno) ou só de fraldas cheias de urina, no caso das crianças mais novas. As crianças encontravam-se sujas e cheiravam mal, uma vez que no referido hiato temporal não tomaram banho.

O Tribunal da Relação de Guimarães deu agora como provado, tal como sustentado pelo Ministério Público na peça recursiva que, ao ausentar-se de casa, deixando os menores entregues à sua sorte, nas condições supra elencadas agiu a arguida com total desrespeito para com os seus filhos e pelo exercício das responsabilidades parentais que lhe competia, enquanto mãe dos mesmos.

O Tribunal superior afastou qualquer justificação de natureza socio-cultural para justificar o comportamento adotado pela arguida e considerou ainda que, no caso, mais do que um simples maltrato perpetrado nestas crianças foi a condição absolutamente desumana em que as 5 crianças se encontravam.

 NUIPC nº 13/21.9PEBGC