Prevaricação; acusação | Ministério Público no Diap Regional do Porto

Prevaricação; tráfico de influência; construção do Hospital de São Martinho, Valongo; acusação | Ministério Público no Diap Regional do Porto

Por despacho de 16.06.2020, o Ministério Público no Diap Regional do Porto acusou dez arguidos, imputando

  • a todos eles a prática de um crime de prevaricação;
  • a um deles, a prática de um crime de tráfico de influência;
  • a quatro, a prática de dois crimes de falsificação de documento agravados;
  • e a um outro a prática de um crime de falsificação de documento agravado.

Os factos constantes da acusação reportam-se ao processo de licenciamento e construção do Hospital de São Martinho, em Valongo, e são arguidos o administrador da sociedade promotora da obra, o então presidente da câmara municipal de Valongo, bem como dois vereadores e três técnicos municipais, o arquitecto e engenheiro responsáveis pelo projecto; um último arguido exercia à data funções de deputado e, de acordo com o indiciado pelo Ministério Público, aceitou ajudar o promotor do investimento, a troco de quantia em dinheiro, para que usando da sua influência política junto do presidente da câmara municipal e dos vereadores lograsse que a construção pudesse ultrapassar os limites legais impostos pelo PDM.

Indiciou o Ministério Público que o processo de licenciamento se iniciou em 2003, para uma construção de quatro pisos, os dois primeiros para uma policlínica e os restantes para escritórios; mas que em 2004, o promotor do investimento solicitou ao município de Valongo a declaração de interesse público, com o consequente aumento do índice máximo de construção de 0,8 inicialmente aprovado para o máximo de 1,5 previsto no PDM de Valongo para obras declaradas de interesse público; mais refere o Ministério Público que para o efeito foi alegada a criação no espaço de um Centro de Noite para idosos, destinado a 20 pessoas, resultante de uma parceria entre o promotor e uma IPSS.

De acordo com a acusação, mercê da influência do arguido deputado, este pedido foi aprovado em reunião de câmara em Maio de 2005, com o fundamento de que a construção iria albergar o dito Centro de Noite, sem que fosse exigida qualquer prova da alegada parceria com a identificada IPSS; parceria que, mais diz o Ministério Público, nem sequer existia, não havendo qualquer protocolo ou instrumento semelhante, entendimento ou sequer projecto, entre a promotora e a IPSS.

O Ministério Público mais indiciou que o edifício foi depois construído com sete pisos, sendo um de cave, sem que esse acrescento fosse objecto de qualquer pedido e decisão de licenciamento para além do projecto inicial de quatro pisos, o que foi feito, acrescenta a acusação, por decisão do promotor, ciente de que o município não colocaria entraves mercê da acção do arguido deputado; descreve o Ministério Público que apesar deste acrescento de três pisos não licenciados, foram várias as atestações sucedidas por técnicos responsáveis de que a obra fora executada de acordo com o projecto aprovado, nomeadamente na vistoria para efeitos de concessão de licença de utilização, em 09.11.2006.

Por fim, o Ministério Público indiciou ainda que em Setembro de 2007, mesmo sabendo que a obra já estava construída com sete pisos, o promotor deu entrada no município de Valongo a um pedido de ampliação da obra, fazendo, então sim, referência aos sete pisos, como se estes não estivessem já construídos; e que este pedido foi depois tratado e decidido no município de Valongo do mesmo modo, ficcionando-se que a obra ainda não estava construída, com os técnicos a darem parecer e os decisores a deferirem, o que levou à emissão de alvará de obras de ampliação em 10.12.2007 e à emissão de alvará de utilização em 21.12.2007.

Ascende a €2 307 346,33 a soma dos montantes que o Ministério Público requer sejam pagos ao Estado a título de perda de vantagens do crime.