Corrupção de substâncias alimentares ou medicinais; condenação | Ministério Público na Comarca de Bragança

Corrupção de substâncias alimentares ou medicinais; alheiras contaminadas por toxina botulínica; condenação | Ministério Público no Tribunal Judicial da Comarca de Bragança (Bragança, juízo central e criminal de Bragança

Por acórdão proferido a 1 de fevereiro de 2023, o Tribunal Judicial da Comarca de Bragança (Bragança, juízo central criminal) condenou, pela prática de quatro crimes de corrupção de substâncias alimentares, agravados pelo resultado;
- um arguido, na pena única de 5 anos de prisão, suspensa sua execução acompanhada de regime de prova e subordinada ao pagamento da indemnização aos lesados e à frequência de ações de formação,
- uma arguida, pessoa coletiva, na pena de única de 600 dias de multa à taxa diária de 100 euros, perfazendo um montante global de €60.000,00 que se substituiu pela prestação de caução de boa conduta no valor de €65.000,00, pelo prazo de 5 anos.
Em síntese, o tribunal deu como provado que, sendo o arguido pessoa singular responsável enquanto gerente, pelos menos desde 10.02.2012, pelos destinos da arguida sociedade comercial, lhe cabia dirigir e determinar os termos de todo o processo de produção de fumeiro a que esta sociedade se dedicava; mais deu como provado que lhe cabia, nomeadamente, a responsabilidade pela aquisição e transporte de matérias-primas, fabricação, embalamento, transporte, acondicionamento e exposição para venda.
Deu ainda como provado que o arguido, no exercício destas suas funções, e no primeiro semestre de 2015 determinou a produção, armazenamento, transporte e comercialização de um fumeiro parcial (chouriças e alheiras), desrespeitando diversas normas higieno-sanitárias que regulam todo este processo, nomeadamente:
não implentara um manual de análise de perigos e pontos críticos de controle;
efectuava o transporte sem observar as condições necessárias para inibir a multiplicação de micro-organismos;
transportava as carnes para produção sem refrigeração;
não tinha assegurada a rastreabilidade das matérias-primas e do produto final, nem estabelecidos os procedimentos de retirada dos produtos do mercado;
não realizava quaisquer análises para detectar a presença de agentes zoonóticos, quer aos produtos recebidos de terceiros, quer aos que produzia;
incumpria diversas normas relativas à rotulagem.
De acordo com o Tribunal, por força de todos os incumprimentos, não só as alheiras foram contaminadas por micro-organismos da bactéria clostridium botulinum, com a consequente produção da toxina botulínica, como essa contaminação nunca foi detectada e foi potenciada por não terem sido observados procedimentos de conservação adequados.
Resultou ainda provado que as alheiras assim contaminadas foram vendidas nos dias 24 e 27.08.2015, no stand da sociedade na Feira Agrival 2015, em Penafiel, e nos dias 05 e 10.09.2015, num restaurante explorado pela sociedade, em Bragança; e consumidas vieram a provocar botulismo em quatro pessoas, com internamento hospitalar e perigo concreto para a vida, dando causa a lesões que demandaram para a cura entre 74 e 181 dias.
Na determinação da medida da pena o Tribunal atendeu, para além do mais, à gravidade das consequências, consideradas muito significativas, quer do ponto de vista físico quer emocional, ao elevado grau de ilicitude e às elevadas necessidades de prevenção geral.

NUIPC 225/15.4EAPRT